quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

The Death of Uncool

"We’re living in a stylistic tropics. There’s a whole generation of people able to access almost anything from almost anywhere, and they don’t have the same localized stylistic sense that my generation grew up with. It’s all alive, all “now,” in an ever-expanding present, be it Hildegard of Bingen or a Bollywood soundtrack. The idea that something is uncool because it’s old or foreign has left the collective consciousness."
Brian Eno

sábado, 21 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (VI)

Para terminar a minha selecção de músicos que trabalham nos limites da música popular e clássica, posso referir ainda os exemplos das óperas criadas por grupos como os The Knife ("Darwin"), Nico Muhly (veio dia 5 de Novembro a Lisboa oferecer-nos um grande concerto), o fascínio de Jonny Greenwood dos Radiohead pela tradição clássica do século XX (principalmente Penderecki, Ligeti e Arvo Part) na banda sonora de There Will Be Blood, e os discos avant-garde dos Sonic Youth - SYR4 (Goodbye Twentieth Century) e SYR5 (Olive's Horn), que nos levam a territórios da música improvisada, John Cage, Steve Reich e Cornelius Cardew.
Existem ainda os exemplos bem conhecidos de Faust e Frank Zappa, mas não tenho autoridade para falar sobre nenhum deles.


Steve Reich

Numa entrevista ao Ípsilon de 30 de Outubro semana, Steve Reich fala precisamente sobre este tema:

«
A transversalidade entre a cultura musical popular e erudita sempre foi natural para Reich, que gosta de lembrar o carácter intemporal desta relação. "Se voltarmos atrás na história verificamos que quase todos os grandes compositores clássicos usaram fontes populares. Na Idade Média e no Renascimento, compositores como Dufay e Josquin Desprez recorreram à melodia de ‘L'homme armé', uma canção muito popular na época, como a base para a composição de missas", explica. "No barroco, Bach e tantos outros inspiraram-se em formas de dança [gavotte, sarabande, giga, etc.], Beethoven usou melodias populares na Sexta Sinfonia [canta] e Stravinsky recorreu a materiais da música folclórica russa na Sagração, em Petrouska ou o Pássaro de Fogo. Ele negou mas estava a mentir!", exclama por entre uma gargalhada. "É impossível separar a vertente erudita de Bartók da música dos camponeses húngaros e veja-se o caso Kurt Weill e da música de cabaret ou a relação de Aaron Copland com o jazz", refere. "A influência da cultura popular é comum a quase todos os músicos desde a Idade Média. Um dos que não fez essa escolha foi Schoenberg mas estava errado! Todos sabemos que a música popular não é música clássica. Usa instrumentos e técnicas diferentes e nem costuma usar notação, mas tal como Alban Berg disse uma vez a Gershwin: ‘Música é música!'"
Sublinha que as várias músicas fazem parte do nosso mundo e podem aprender umas com as outras.
"Muitos DJs hoje e pessoas da Dance Music vão buscar coisas à minha obra, às peças dos anos 60 e 70. Quer dizer que aprendem como ela da mesma forma que eu aprendo a ouvir Miles Davis e John Coltrane."
»

Steve Reich apresentou o seu trabalho em Lisboa, no CCB, a 1 de Novembro – um concerto memorável.


A separação entre música popular e música clássica faz cada vez menos sentido actualmente. As próprias classificações não nos parecem correctas nem actualizadas - a música experimental de Laurie Anderson é classificada de música popular, da mesma forma que o industrial de Einsturzende Neubauten e o hip-hop de Jay-Z.
Paralelamente, a música clássica estilhaçou-se no século XX, a começar em Schoenberg e a acabar em Cage e Steve Reich - música clássica ela não é, erudita muito menos.
Nas contínuas e cada vez maiores contaminações entre música clássica e popular, as fronteiras esbateram-se e tornaram-se inseguras (tornaram-se até contraproducentes).
Talvez possamos falar apenas em tradições - tradições sonoras.
No mundo da informação imediata, é possível ouvir com a mesma facilidade o antigo e o moderno. Um músico ou um melómano que oiça com os ouvidos de hoje não pensa no passado propriamente em tempo sequencial, mas como um conjunto de sons à espera de serem re-interpretados e misturados.
A tradição já não é o que era.





sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (V)

Alva Noto + Ryuichi Sakamoto
Insen Live
utp_ Live

Não escondo o meu entusiasmo por este duo que combina o piano com a electrónica minimal. Pela minha parte, foi amor à primeira vista (já falei de Alva Noto e da label raster-noton aqui).
Alva Noto (Carsten Nicolai) manipula digitalmente o som melódico do piano de Ryuichi Sakamoto, pontuando-o com micro-batidas, ruído e white noise de forma minuciosa, como se de uma tapeçaria delicada se tratasse. Dois álbuns, Vrioon de 2002 e Insen de 2005, tornaram-se clássicos instantâneos no momento em que saíram.

Insen Live, o DVD do concerto filmado na Casa da Música (Porto, 2005/6), tem a leveza e preciosidade de um concerto intimista, e a precisão de um concerto clássico. O som em palco, com cores e vibrações projectadas em background, torna-se evocativo e visual, e em certos momentos parece estarmos perante um medium inteiramente diferente – não sabemos se começa em som e acaba em imagem ou o contrário… O som é emotivo (de uma forma nada óbvia) e de uma enorme simplicidade. Todos as notas de Sakamoto e todos os efeitos de Alva parecem necessários e suficientes.

Utp_ foi um concerto comissariado para os 400 anos da cidade de Mannheim (Alemanha) em 2007 (para tornar a história simples, ou talvez não, utp_= utopia). Desta vez, para além de um concerto audiovisual, o duo seguiu um caminho mais experimental e adicionou uma secção de cordas (Ensemble Modern), que ofereceu ao concerto outras “vozes” e mais textura. O registo é mais orquestral, mas também mais fragmentado.

As edições em DVD são elas próprias objectos artísticos, com um design perfeito e atenção ao detalhe.

Mais uma vez a música electrónica encontra a música clássica. O que é música clássica hoje? O que é música popular e música experimental?






domingo, 15 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (IV)


London Sinfonietta /
Aphex Twin, Squarepusher

É interessante como a aproximação à música clássica, ou pelo menos à música de composição do séc.XX, chega quase sempre através da música electrónica. Neste álbum, que organiza o conjunto de três concertos interpretados pela London Sinfonietta, a música electrónica de Aphex Twin e Squarepusher (ambos da label Warp) é re-interpretada e colocada lado a lado com peças de Stockhausen, Cage, Reich, Ligeti e Varèse, numa tentativa de colar a nova geração de génios da electrónica à tradição da música avant-garde e erudita do século XX. O ouvinte decidirá. Uma coisa é certa, não é um álbum fácil.
Os arranjos clássicos transformam a electrónica em som "acústico" e mecânico, por vezes deixando para trás parte da complexidade e textura da música electrónica (simplesmente porque são impossíveis de interpretar por seres humanos, mesmo com orquestra).
Trata-se de mostrar que Aphex Twin (Richard D. James) e Squarepusher (Tom Jenkinson) são apenas a última encarnação dos pioneiros da música electrónica. A estes nomes poderia ainda juntar-se Autechre, outro bastião da Warp.

Este artigo da revista Wire mostra as declarações de Stockhausen depois de ouvir a música electrónica e de dança de alguns dos seus precursores, circa 1995, entre eles Aphex Twin. Um documento surpreendente.

Quando a Pop quer ser Clássica (III)



Lou Reed / Zeitkratzer

Lou Reed não precisava de Metal Machine Music para ficar na história da música (um álbum chegava - Velvet Undergound & Nico). Mas em 1975, depois de três álbuns bem sucedidos a solo (Transformer, Berlin, Sally Can't Dance), resolveu fazer um álbum noise que marcou uma divisão na sua carreira - Metal Machine Music (An Electronic Instrumental Composition), que dividiu e divide até hoje a comunidade musical.
Persiste a dúvida se MMM foi uma forma de Lou Reed rescindir o contrato com a label RCA, gravando um álbum o mais inaudível possível para um público habituado a canções como "Walk on the Wild Side", ou se foi, de facto, um poderoso e corajoso manifesto artístico (que se pode considerar precursor do punk, heavy metal ou música industrial, dependendo da perspectiva).
O álbum, dividido em 4 faixas, é abrasivo como uma parede sonora, onde o feedback de guitarra testa os limites do razoável. A textura do ruído parece revelar melodias escondidas, quase psicadélicas - música para o subconsciente.
O que é certo é que muita gente levou o álbum a sério. Grupos como Sonic Youth e Merzbow terão sido influenciados por MMM. Recentemente, Zeitkratzer, um grupo orquestral alemão, transcreveu de forma surpreendente os sons para
11 instrumentos de cordas e gravou um concerto (onde os músicos parecem combater contra o próprio instrumento), que teve a participação de Lou Reed (editado em CD+DVD em 2007).


segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (II)


Portishead, originários de Bristol, UK, são dos grupos mais influentes da actualidade, apenas com três albuns, Dummy (1994), Portishead (1997) e, mais de dez anos depois, Third (2008). Em 1998 gravam um álbum ao vivo em Roseland, Nova Iorque, onde combinam o seu som típico de sampling, scratching e guitarras com os mais de 30 elementos da New York Philharmonic Orchestra, o que resulta numa sonoridade urbana, melancólica, quase cinematográfica - ao mesmo tempo nostálgica e futurista.

domingo, 1 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica

As contaminações música popular com a música clássica não são de agora, mas vou tentar fazer uma compilação das colaborações recentes mais interessantes, numa altura em que a divisão entre música popular e clássica está em crise. Talvez o exemplo mais acabado dessa mistura seja o da islandesa Bjork.


Bjork
Live at Royal Opera House
Live at Cambridge

Não é de espantar que Bjork tenha um olhar tão particular sobre a música. Tal como a maior parte da população da Islândia, Bjork teve uma educação musical clássica. Nos anos 80, também como a maioria dos jovens de Reykjavik, Bjork fez parte de várias bandas de punk-rock (Kulk, Sugarcubes, ...). Essa dualidade entre a tradição e o desejo de afirmação geracional e individual revelou-se desde cedo. Bjork sempre revelou um gosto eclético nas propostas sonoras para cada álbum e, tão importante quanto isso, grande criatividade quando escolhe os instrumentos para apresentar cada álbum ao vivo. Desde a electrónica poderosa de Mark Bell e Leila (concertos do álbum Post e Homogenic), até à kora de Diabaté e aos instrumentos de sopro que usou nos concertos do último álbum, Volta, Bjork revela uma preocupação imensa com o universalismo da música tanto em termos geográficos como temporais. Para Bjork, a kora, na sua especificidade africana, não é inferior à guitarra que toda a gente conhece, e um sintetizador moderno tem tanta importância na música como um intrumento clássico como o violino.

É dentro dessa universalidade da música que Bjork se inscreve - a sua música é ao mesmo tempo clássica, avant-garde, indie e pop.

No concerto de Cambridge, em 1998, Bjork procurou a sonoridade clássica das canções pop de Homogenic, com um quarteto de cordas a acompanhar Mark Bell na electrónica.
No concerto na Royal Opera House de Londres, em 2001, Bjork tentou ir mais longe, e convidou Matmos (um duo de música experimental que produz e manipula sons a partir de objectos comuns), um grupo coral da Gronelândia e uma harpista, para em conjunto recriar o som minimal e muito electrónico do álbum Vespertine. O resultado foi um som delicado e orgânico.
O trabalho de Bjork com John Taverner e a reverência por Arvo Part e Stockhausen vêm reforçar ainda mais a sua proximidade com a música de composição do século XX (e complicar também os termos de separação entre música popular e música clássica).






quinta-feira, 8 de outubro de 2009

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Descoberta: Se a Ópera fosse Pop



Wagner - Tristão e Isolda - Liebestod
Excerto realizado por Franc Roddam, do filme Aria (1987, Jean-Luc Godard, Robert Altman, Derek Jarman, Nicolas Roeg, entre outros)

Re-edição do DVD:
Trailer
Amazon

domingo, 20 de setembro de 2009

O drama ele próprio

Seis Personagens à Procura de Autor, de Luigi Pirandello, em cena no S. Luiz até 18 de Outubro.
Quanto menos souber antes de ir, melhor.
Se não resistir: Ípsilon

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A propósito de Tarantino...



"Nothing makes me happier than for Paul [Thomas Anderson] to come out with a masterpiece like There Will Be Blood and I couldn't be more pleased for him, proud of him and nothing inspires me more to do better, so I can actually say while there is no thematic link to my new movie Inglorious Basterds, with There Will Be Blood... If I reach high points with Inlgorious Basterds it is partly because Paul came out with There Will Be Blood a couple of years ago and I realised I had to bring up my game."

Ficámos a saber porque é que Inglorious Basterds foi tão bom.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Hyperdub / Dubstep

Em 2006, surgiu um novo tipo de música vindo de Bristol. A editora Hyperdub, que vai celebrar 5 anos em 2009 com uma compilação, foi a responsável por reunir Burial, Kode9, Joker, entre outros, sob a mesma alçada e dar origem ao dubstep. É algo proveniente do jungle e drum 'n bass, nascido na profundeza das metrópoles, as batidas da cidade pulsante. Sei que trip-hop e dubstep não são a mesma coisa, mas ouvir Burial neste momento é como ouvir Massive Attack pela primeira vez. Dois trabalhos definitivos do género: o álbum homónimo de Burial (álbum do ano '06 pela revista Wire), e Memories of the Future, de Kode9 & The Spaceape. Burial é como estar a deambular por uma cidade deserta, depressiva, à chuva, a altas horas da noite, sem saber quando vai amanhecer =). Memories of the Future são batidas antigas do respirar da cidade contemporânea... e que me introduziu a um novo tipo de minimalismo.
Uma amostra mais recente de Kode9, com sabor a Metropolis:



Fica ainda o vídeo de Marie-Ann Hobbs, DJ da BBC Radio 1 (mp3 aqui) e grande promotora do dubstep, grime, etc., prestes a lançar um álbum em nome próprio. Uma compilação de sons e efeitos visuais extraordinários:


Para ler: k-punk: London after the rave

hyperdub.com
www.myspace.com/hyperdub

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Descoberta

O vídeo oficial de "Shot In The Back", tema retirado do último álbum de Moby ("Wait for Me" sai a 30 de Junho), e realizado por David Lynch:



David Lynch Foundation Television: dlf.tv
Download em moby.com

quinta-feira, 5 de março de 2009

"Art Is Dead"

Tehching Hsieh é uma quase-lenda do mundo artístico contemporâneo. As suas performances confundem-se com a vida real, são meditações sobre a passagem do tempo e envolvem muitas vezes provações físicas. Hsieh é um artista de Taiwan que emigrou para Nova Iorque na década de 70, onde executou apenas 6 obras/performances, a maioria das quais teve a duração de um ano. Culminaram a 1 de Janeiro de 2000, data a partir da qual deixou permanentemente de fazer arte.
Sabendo como a arte pode ficar perdida na tradução para um objecto artístico (seja ele qual for), e sabendo como a arte é muitas vezes subvertida pelo valor económico do próprio objecto artístico, já para não falar na sua natureza de exclusividade... a obra de Hsieh é um afastamento refrescante da arte dos objectos para se tornar mais próxima do que a arte deve ser: uma dádiva para o mundo. As performances de Hsieh são puras e sem intermediários, são rigorosas, contemplativas, são de uma generosidade incomensurável e de uma dureza exasperante...
A propósito da nova exposição do MoMA, em Nova Iorque.
Tehching Hsieh para sempre.

“In the vibrant downtown Manhattan art scene of the late 1970s and early 1980s, the Taiwanese-American artist Tehching Hsieh made an exceptional series of artworks. Hsieh realized five separate one-year-long performances that were unprecedented in their use of physical difficulty over extreme durations and in their absolute conception of art and life as simultaneous processes.

In the unfolding series of these projects Hsieh moved from a year of solitary confinement without any communication, to a year in which he punched a worker’s time clock in his studio on the hour every hour, to a year spent living without any shelter on the streets, to a year in which he was tied closely to the artist Linda Montano without ever touching and, lastly, to a year of total abstention from art activities and influences. In 1986 Hsieh announced that he would spend the next thirteen years making art but not showing it publicly. This final lifework—an immense act of self-affirmation and self-erasure—came to a close at the turn of the millennium.

For many Hsieh is a cult figure. The rigor and dedication of his art inspires passion, while the elusive and epic nature of his performances generates speculation and mythology. After years of near-invisibility Hsieh has now collaborated with the writer and curator Adrian Heathfield to create this meticulous and visually arresting record of the complete body of his artworks from 1978-1999.”

(http://mitpress.mit.edu/catalog/item/default.asp?ttype=2&tid=11674)