quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

The Death of Uncool

"We’re living in a stylistic tropics. There’s a whole generation of people able to access almost anything from almost anywhere, and they don’t have the same localized stylistic sense that my generation grew up with. It’s all alive, all “now,” in an ever-expanding present, be it Hildegard of Bingen or a Bollywood soundtrack. The idea that something is uncool because it’s old or foreign has left the collective consciousness."
Brian Eno

sábado, 21 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (VI)

Para terminar a minha selecção de músicos que trabalham nos limites da música popular e clássica, posso referir ainda os exemplos das óperas criadas por grupos como os The Knife ("Darwin"), Nico Muhly (veio dia 5 de Novembro a Lisboa oferecer-nos um grande concerto), o fascínio de Jonny Greenwood dos Radiohead pela tradição clássica do século XX (principalmente Penderecki, Ligeti e Arvo Part) na banda sonora de There Will Be Blood, e os discos avant-garde dos Sonic Youth - SYR4 (Goodbye Twentieth Century) e SYR5 (Olive's Horn), que nos levam a territórios da música improvisada, John Cage, Steve Reich e Cornelius Cardew.
Existem ainda os exemplos bem conhecidos de Faust e Frank Zappa, mas não tenho autoridade para falar sobre nenhum deles.


Steve Reich

Numa entrevista ao Ípsilon de 30 de Outubro semana, Steve Reich fala precisamente sobre este tema:

«
A transversalidade entre a cultura musical popular e erudita sempre foi natural para Reich, que gosta de lembrar o carácter intemporal desta relação. "Se voltarmos atrás na história verificamos que quase todos os grandes compositores clássicos usaram fontes populares. Na Idade Média e no Renascimento, compositores como Dufay e Josquin Desprez recorreram à melodia de ‘L'homme armé', uma canção muito popular na época, como a base para a composição de missas", explica. "No barroco, Bach e tantos outros inspiraram-se em formas de dança [gavotte, sarabande, giga, etc.], Beethoven usou melodias populares na Sexta Sinfonia [canta] e Stravinsky recorreu a materiais da música folclórica russa na Sagração, em Petrouska ou o Pássaro de Fogo. Ele negou mas estava a mentir!", exclama por entre uma gargalhada. "É impossível separar a vertente erudita de Bartók da música dos camponeses húngaros e veja-se o caso Kurt Weill e da música de cabaret ou a relação de Aaron Copland com o jazz", refere. "A influência da cultura popular é comum a quase todos os músicos desde a Idade Média. Um dos que não fez essa escolha foi Schoenberg mas estava errado! Todos sabemos que a música popular não é música clássica. Usa instrumentos e técnicas diferentes e nem costuma usar notação, mas tal como Alban Berg disse uma vez a Gershwin: ‘Música é música!'"
Sublinha que as várias músicas fazem parte do nosso mundo e podem aprender umas com as outras.
"Muitos DJs hoje e pessoas da Dance Music vão buscar coisas à minha obra, às peças dos anos 60 e 70. Quer dizer que aprendem como ela da mesma forma que eu aprendo a ouvir Miles Davis e John Coltrane."
»

Steve Reich apresentou o seu trabalho em Lisboa, no CCB, a 1 de Novembro – um concerto memorável.


A separação entre música popular e música clássica faz cada vez menos sentido actualmente. As próprias classificações não nos parecem correctas nem actualizadas - a música experimental de Laurie Anderson é classificada de música popular, da mesma forma que o industrial de Einsturzende Neubauten e o hip-hop de Jay-Z.
Paralelamente, a música clássica estilhaçou-se no século XX, a começar em Schoenberg e a acabar em Cage e Steve Reich - música clássica ela não é, erudita muito menos.
Nas contínuas e cada vez maiores contaminações entre música clássica e popular, as fronteiras esbateram-se e tornaram-se inseguras (tornaram-se até contraproducentes).
Talvez possamos falar apenas em tradições - tradições sonoras.
No mundo da informação imediata, é possível ouvir com a mesma facilidade o antigo e o moderno. Um músico ou um melómano que oiça com os ouvidos de hoje não pensa no passado propriamente em tempo sequencial, mas como um conjunto de sons à espera de serem re-interpretados e misturados.
A tradição já não é o que era.





sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (V)

Alva Noto + Ryuichi Sakamoto
Insen Live
utp_ Live

Não escondo o meu entusiasmo por este duo que combina o piano com a electrónica minimal. Pela minha parte, foi amor à primeira vista (já falei de Alva Noto e da label raster-noton aqui).
Alva Noto (Carsten Nicolai) manipula digitalmente o som melódico do piano de Ryuichi Sakamoto, pontuando-o com micro-batidas, ruído e white noise de forma minuciosa, como se de uma tapeçaria delicada se tratasse. Dois álbuns, Vrioon de 2002 e Insen de 2005, tornaram-se clássicos instantâneos no momento em que saíram.

Insen Live, o DVD do concerto filmado na Casa da Música (Porto, 2005/6), tem a leveza e preciosidade de um concerto intimista, e a precisão de um concerto clássico. O som em palco, com cores e vibrações projectadas em background, torna-se evocativo e visual, e em certos momentos parece estarmos perante um medium inteiramente diferente – não sabemos se começa em som e acaba em imagem ou o contrário… O som é emotivo (de uma forma nada óbvia) e de uma enorme simplicidade. Todos as notas de Sakamoto e todos os efeitos de Alva parecem necessários e suficientes.

Utp_ foi um concerto comissariado para os 400 anos da cidade de Mannheim (Alemanha) em 2007 (para tornar a história simples, ou talvez não, utp_= utopia). Desta vez, para além de um concerto audiovisual, o duo seguiu um caminho mais experimental e adicionou uma secção de cordas (Ensemble Modern), que ofereceu ao concerto outras “vozes” e mais textura. O registo é mais orquestral, mas também mais fragmentado.

As edições em DVD são elas próprias objectos artísticos, com um design perfeito e atenção ao detalhe.

Mais uma vez a música electrónica encontra a música clássica. O que é música clássica hoje? O que é música popular e música experimental?






domingo, 15 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (IV)


London Sinfonietta /
Aphex Twin, Squarepusher

É interessante como a aproximação à música clássica, ou pelo menos à música de composição do séc.XX, chega quase sempre através da música electrónica. Neste álbum, que organiza o conjunto de três concertos interpretados pela London Sinfonietta, a música electrónica de Aphex Twin e Squarepusher (ambos da label Warp) é re-interpretada e colocada lado a lado com peças de Stockhausen, Cage, Reich, Ligeti e Varèse, numa tentativa de colar a nova geração de génios da electrónica à tradição da música avant-garde e erudita do século XX. O ouvinte decidirá. Uma coisa é certa, não é um álbum fácil.
Os arranjos clássicos transformam a electrónica em som "acústico" e mecânico, por vezes deixando para trás parte da complexidade e textura da música electrónica (simplesmente porque são impossíveis de interpretar por seres humanos, mesmo com orquestra).
Trata-se de mostrar que Aphex Twin (Richard D. James) e Squarepusher (Tom Jenkinson) são apenas a última encarnação dos pioneiros da música electrónica. A estes nomes poderia ainda juntar-se Autechre, outro bastião da Warp.

Este artigo da revista Wire mostra as declarações de Stockhausen depois de ouvir a música electrónica e de dança de alguns dos seus precursores, circa 1995, entre eles Aphex Twin. Um documento surpreendente.

Quando a Pop quer ser Clássica (III)



Lou Reed / Zeitkratzer

Lou Reed não precisava de Metal Machine Music para ficar na história da música (um álbum chegava - Velvet Undergound & Nico). Mas em 1975, depois de três álbuns bem sucedidos a solo (Transformer, Berlin, Sally Can't Dance), resolveu fazer um álbum noise que marcou uma divisão na sua carreira - Metal Machine Music (An Electronic Instrumental Composition), que dividiu e divide até hoje a comunidade musical.
Persiste a dúvida se MMM foi uma forma de Lou Reed rescindir o contrato com a label RCA, gravando um álbum o mais inaudível possível para um público habituado a canções como "Walk on the Wild Side", ou se foi, de facto, um poderoso e corajoso manifesto artístico (que se pode considerar precursor do punk, heavy metal ou música industrial, dependendo da perspectiva).
O álbum, dividido em 4 faixas, é abrasivo como uma parede sonora, onde o feedback de guitarra testa os limites do razoável. A textura do ruído parece revelar melodias escondidas, quase psicadélicas - música para o subconsciente.
O que é certo é que muita gente levou o álbum a sério. Grupos como Sonic Youth e Merzbow terão sido influenciados por MMM. Recentemente, Zeitkratzer, um grupo orquestral alemão, transcreveu de forma surpreendente os sons para
11 instrumentos de cordas e gravou um concerto (onde os músicos parecem combater contra o próprio instrumento), que teve a participação de Lou Reed (editado em CD+DVD em 2007).


segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica (II)


Portishead, originários de Bristol, UK, são dos grupos mais influentes da actualidade, apenas com três albuns, Dummy (1994), Portishead (1997) e, mais de dez anos depois, Third (2008). Em 1998 gravam um álbum ao vivo em Roseland, Nova Iorque, onde combinam o seu som típico de sampling, scratching e guitarras com os mais de 30 elementos da New York Philharmonic Orchestra, o que resulta numa sonoridade urbana, melancólica, quase cinematográfica - ao mesmo tempo nostálgica e futurista.

domingo, 1 de novembro de 2009

Quando a Pop quer ser Clássica

As contaminações música popular com a música clássica não são de agora, mas vou tentar fazer uma compilação das colaborações recentes mais interessantes, numa altura em que a divisão entre música popular e clássica está em crise. Talvez o exemplo mais acabado dessa mistura seja o da islandesa Bjork.


Bjork
Live at Royal Opera House
Live at Cambridge

Não é de espantar que Bjork tenha um olhar tão particular sobre a música. Tal como a maior parte da população da Islândia, Bjork teve uma educação musical clássica. Nos anos 80, também como a maioria dos jovens de Reykjavik, Bjork fez parte de várias bandas de punk-rock (Kulk, Sugarcubes, ...). Essa dualidade entre a tradição e o desejo de afirmação geracional e individual revelou-se desde cedo. Bjork sempre revelou um gosto eclético nas propostas sonoras para cada álbum e, tão importante quanto isso, grande criatividade quando escolhe os instrumentos para apresentar cada álbum ao vivo. Desde a electrónica poderosa de Mark Bell e Leila (concertos do álbum Post e Homogenic), até à kora de Diabaté e aos instrumentos de sopro que usou nos concertos do último álbum, Volta, Bjork revela uma preocupação imensa com o universalismo da música tanto em termos geográficos como temporais. Para Bjork, a kora, na sua especificidade africana, não é inferior à guitarra que toda a gente conhece, e um sintetizador moderno tem tanta importância na música como um intrumento clássico como o violino.

É dentro dessa universalidade da música que Bjork se inscreve - a sua música é ao mesmo tempo clássica, avant-garde, indie e pop.

No concerto de Cambridge, em 1998, Bjork procurou a sonoridade clássica das canções pop de Homogenic, com um quarteto de cordas a acompanhar Mark Bell na electrónica.
No concerto na Royal Opera House de Londres, em 2001, Bjork tentou ir mais longe, e convidou Matmos (um duo de música experimental que produz e manipula sons a partir de objectos comuns), um grupo coral da Gronelândia e uma harpista, para em conjunto recriar o som minimal e muito electrónico do álbum Vespertine. O resultado foi um som delicado e orgânico.
O trabalho de Bjork com John Taverner e a reverência por Arvo Part e Stockhausen vêm reforçar ainda mais a sua proximidade com a música de composição do século XX (e complicar também os termos de separação entre música popular e música clássica).






quinta-feira, 8 de outubro de 2009

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Descoberta: Se a Ópera fosse Pop



Wagner - Tristão e Isolda - Liebestod
Excerto realizado por Franc Roddam, do filme Aria (1987, Jean-Luc Godard, Robert Altman, Derek Jarman, Nicolas Roeg, entre outros)

Re-edição do DVD:
Trailer
Amazon

domingo, 20 de setembro de 2009

O drama ele próprio

Seis Personagens à Procura de Autor, de Luigi Pirandello, em cena no S. Luiz até 18 de Outubro.
Quanto menos souber antes de ir, melhor.
Se não resistir: Ípsilon

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A propósito de Tarantino...



"Nothing makes me happier than for Paul [Thomas Anderson] to come out with a masterpiece like There Will Be Blood and I couldn't be more pleased for him, proud of him and nothing inspires me more to do better, so I can actually say while there is no thematic link to my new movie Inglorious Basterds, with There Will Be Blood... If I reach high points with Inlgorious Basterds it is partly because Paul came out with There Will Be Blood a couple of years ago and I realised I had to bring up my game."

Ficámos a saber porque é que Inglorious Basterds foi tão bom.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Hyperdub / Dubstep

Em 2006, surgiu um novo tipo de música vindo de Bristol. A editora Hyperdub, que vai celebrar 5 anos em 2009 com uma compilação, foi a responsável por reunir Burial, Kode9, Joker, entre outros, sob a mesma alçada e dar origem ao dubstep. É algo proveniente do jungle e drum 'n bass, nascido na profundeza das metrópoles, as batidas da cidade pulsante. Sei que trip-hop e dubstep não são a mesma coisa, mas ouvir Burial neste momento é como ouvir Massive Attack pela primeira vez. Dois trabalhos definitivos do género: o álbum homónimo de Burial (álbum do ano '06 pela revista Wire), e Memories of the Future, de Kode9 & The Spaceape. Burial é como estar a deambular por uma cidade deserta, depressiva, à chuva, a altas horas da noite, sem saber quando vai amanhecer =). Memories of the Future são batidas antigas do respirar da cidade contemporânea... e que me introduziu a um novo tipo de minimalismo.
Uma amostra mais recente de Kode9, com sabor a Metropolis:



Fica ainda o vídeo de Marie-Ann Hobbs, DJ da BBC Radio 1 (mp3 aqui) e grande promotora do dubstep, grime, etc., prestes a lançar um álbum em nome próprio. Uma compilação de sons e efeitos visuais extraordinários:


Para ler: k-punk: London after the rave

hyperdub.com
www.myspace.com/hyperdub

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Descoberta

O vídeo oficial de "Shot In The Back", tema retirado do último álbum de Moby ("Wait for Me" sai a 30 de Junho), e realizado por David Lynch:



David Lynch Foundation Television: dlf.tv
Download em moby.com

quinta-feira, 5 de março de 2009

"Art Is Dead"

Tehching Hsieh é uma quase-lenda do mundo artístico contemporâneo. As suas performances confundem-se com a vida real, são meditações sobre a passagem do tempo e envolvem muitas vezes provações físicas. Hsieh é um artista de Taiwan que emigrou para Nova Iorque na década de 70, onde executou apenas 6 obras/performances, a maioria das quais teve a duração de um ano. Culminaram a 1 de Janeiro de 2000, data a partir da qual deixou permanentemente de fazer arte.
Sabendo como a arte pode ficar perdida na tradução para um objecto artístico (seja ele qual for), e sabendo como a arte é muitas vezes subvertida pelo valor económico do próprio objecto artístico, já para não falar na sua natureza de exclusividade... a obra de Hsieh é um afastamento refrescante da arte dos objectos para se tornar mais próxima do que a arte deve ser: uma dádiva para o mundo. As performances de Hsieh são puras e sem intermediários, são rigorosas, contemplativas, são de uma generosidade incomensurável e de uma dureza exasperante...
A propósito da nova exposição do MoMA, em Nova Iorque.
Tehching Hsieh para sempre.

“In the vibrant downtown Manhattan art scene of the late 1970s and early 1980s, the Taiwanese-American artist Tehching Hsieh made an exceptional series of artworks. Hsieh realized five separate one-year-long performances that were unprecedented in their use of physical difficulty over extreme durations and in their absolute conception of art and life as simultaneous processes.

In the unfolding series of these projects Hsieh moved from a year of solitary confinement without any communication, to a year in which he punched a worker’s time clock in his studio on the hour every hour, to a year spent living without any shelter on the streets, to a year in which he was tied closely to the artist Linda Montano without ever touching and, lastly, to a year of total abstention from art activities and influences. In 1986 Hsieh announced that he would spend the next thirteen years making art but not showing it publicly. This final lifework—an immense act of self-affirmation and self-erasure—came to a close at the turn of the millennium.

For many Hsieh is a cult figure. The rigor and dedication of his art inspires passion, while the elusive and epic nature of his performances generates speculation and mythology. After years of near-invisibility Hsieh has now collaborated with the writer and curator Adrian Heathfield to create this meticulous and visually arresting record of the complete body of his artworks from 1978-1999.”

(http://mitpress.mit.edu/catalog/item/default.asp?ttype=2&tid=11674)

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Nine Inch Nails: The Downward Spiral

Numa altura em que os Nine Inch Nails parecem ser os próximos U2, é difícil lembrar os tempos em que os NIN, isto é, Trent Reznor, fazia álbuns conceptuais e editava trabalhos arriscados, com uma boa dose de experimentalismo e até ousadia. Músicas como Closer, de aparente simplismo mas de grande complexidade psicológica. Depois da espécie de circo que foi o lançamento, nos últimos quatro anos, de Year Zero, Ghosts I-IV e The Slip, com manobras de marketing e álbuns grátis oferecidos na internet à mistura, a rivalizar com os Radiohead, os Nine Inch Nails parecem ter atingido as massas e o respeito do público. Não o meu.

Comecei a interessar-me por NIN depois de The Fragile (1999), e o que mais me impressionava eram os sons de um mundo construído de raiz, cheio de solidão, dureza e paranóia. NIN eram únicos. O som era rock industrial mas era também algo diferente, era o mundo muito pessoal de Trent Reznor. As camadas de sons eram abstractas como a vastidão de paisagens desoladoras criadas a partir da cabeça de alguém perto da demência (em The Fragile, Things Falling Apart); ou a degradação e eventual anulação da identidade (em The Downward Spiral, Further Down The Spiral); a quebra das regras simbolizada no conceito da heresia (em Broken, The Downward Spiral); e o trabalho precursor que simbolizou a chegada do rock industrial ao mainstream – Pretty Hate Machine (1989). The Downward Spiral (1994) é talvez o álbum que resume Nine Inch Nails, e é ao mesmo tempo um dos melhores álbuns de sempre.
Tudo o que estava associado a Trent Reznor era excitante, como a parceria com David Lynch para a produção da banda sonora de Lost Highway, as performances e o trabalho de bastidores com David Bowie, a banda sonora para o vídeo-jogo Quake, a produção dos primeiros álbuns de Marilyn Manson, Twiggy Ramirez, as afinidades com Tool








Espiral Descendente

Parece, portanto, que são tempos que não voltam mais, para o bem e para o mal. Trent Reznor parece interessado em novos desafios, como transformar os concertos em eventos multimédia com tecnologia de ponta (como o último tour norte-americano Nights In The Sky) e em liderar a inovação na distribuição da música a um nível global, sem prejudicar os lucros. Em vez de deixarem a promoção e a maioria dos lucros nas mãos de uma editora, os NIN tomaram as rédeas da sua própria música e começaram a promover formas de o público se envolver com a banda (incluindo um jogo meta-virtual na internet para o lançamento de Year Zero), em vez de usar os antigos mecanismos publicitários. Os novos desenvolvimentos tecnológicos permitem isso mesmo – os gastos de distribuição para comercializar álbuns digitais no próprio site são muito reduzidos; filmar um vídeo musical, e mesmo concertos, deixou de ser dispendioso; os NIN descobriram novas maneiras de fazerem o público interessar-se, como oferecer 400GB de actuações ao vivo do último Tour, livres para serem editadas por qualquer um.

Trent Reznor apercebeu-se apenas de uma nova ideologia de fazer negócios que há algum tempo inunda a internet e não só – a de que é possível oferecer um produto grátis se houver pacotes de valor acrescentado, como edições limitadas, edições especiais assinadas, em que apenas uma fracção dos consumidores (os verdadeiros fãs) paga pela totalidade dos custos do produto, ao mesmo tempo que se mantém toda a gente envolvida e se gera momentum e hype.

Esta nova fase na carreira dos Nine Inch Nails vem na sequência de uma mudança de rumo na vida pessoal de Trent Reznor, que decidiu afastar-se da depressão, drogas, e a atitude auto-destrutiva. Ainda bem que essa mudança aconteceu, mas não se pode dizer que a música tenha saído favorecida.

Estava a brincar quando disse que os NIN parecem ser os próximos U2. Mas parece-me que os NIN deixaram de ser uma banda de nichos para passarem a ser uma marca, e isso à custa da qualidade da música. (Não igual, mas algo remotamente parecido com uns Rolling Stones ou uma Madonna, cuja qualidade musical se confunde e se extingue com a fama e a história da cultura pop). De tal forma, que o modo como os NIN estão a modificar os paradigmas da relação das bandas com o público é mais interessante que a própria música em si, que foi lançada numa sequência de álbuns medíocres (em comparação com trabalho anterior).
Uma coisa muito própria dos nossos tempos, portanto, em que é mais interessante o que está por detrás da cortina do que no palco.



www.nin.com
Wikipedia | Discografia
Music Milestones: 20 Years of Nine Inch Nails

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

sábado, 21 de fevereiro de 2009

OFFF 2009

O OFFF 2009 ("International Festival for the Post-Digital Creation of Culture") vai decorrer em Oeiras a 7, 8 e 9 de Maio. É um evento internacional que já passou por Nova Iorque, Barcelona e Lisboa e junta, anualmente, desde 2001, design, música, eventos multimédia, tecnologia, e tudo o que tenha a ver com artes digitais e cultura visual. Este ano, os convidados principais são os artistas da label Raster-Noton, de que já falei neste blog - Alva Noto, Kangding Ray, Byetone, COH, Frank Bretschneider, entre outros. Vai ser lançada uma compilação especialmente produzida para o evento. Os bilhetes andam à volta dos 85€ para os três dias (portes de envio incluídos), portanto ainda não sei muito bem como vou fazer para poder ir. Há estratégias em discussão, mas nada em concreto. Fica aqui o apelo aos reverenciáveis produtores do evento para não se esquecerem de quem faz publicidade...

www.offf.ws/

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Ubuweb

Depois de uma pausa para pensar que caminho dar ao blog, aqui vai uma referência a um site que me tem dado muitas surpresas. A UBUWEB, um projecto do poeta Americano Kenneth Goldsmith, é uma base de informação especializada em "poesia concreta" e conteúdos áudio e vídeo sobre as vanguardas artísticas desde os primórdios do século XX até hoje. Clássicos do avant-garde, raridades, e em geral conteúdos que não estão disponíveis (nem sequer comercialmente), são disponibilizados aqui livremente – muitas vezes sem permissão – e é possível fazer download quase sempre. Encontrei aqui pérolas como Sorrows de Gregory Markopoulos ou a obra integral magnífica de Maya Deren, (entretanto retirada devido a direitos de autor), Velvet Underground, de Andy Warhol, um documentário de Teshigakara sobre Gaudí, obras de John Cage, vídeos de Nam June-Paik, Richard Serra, Gordon Matta Clark, Brakhage, Michael Snow
Só pela visibilidade que dá a este tipo de trabalhos, a ubuweb faz um serviço tremendo ao público que nunca teria acesso a obras artísticas essenciais que raramente são exibidas devido à sua natureza experimental ou simplesmente por serem underground. Estes registos áudio e vídeo, nem sempre disponíveis com a melhor qualidade, são importantes para compreender a evolução da prática artística e a complexidade da história da arte do século XX.

http://www.ubuweb.com/

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Rewind 2008 IX: Descobertas

Com este segmento, termino a minha revisão de 2008. Espero que as minhas escolhas tenham sido interessantes. Dêem a vossa opinião.
Estas foram algumas das minhas descobertas em 2008:

Steve Reich


YouTube
Documentário sobre Steve Reich:
http://www.youtube.com/watch?v=e_pR1sHHeQU
Wikipedia


Anne Teresa De Keersmaeker


YouTube
Wikipedia


Scott Walker


Mais aqui
Performance: Rosary
Wikipedia


Laurie Anderson


Wikipedia
http://www.ubu.com/sound/anderson.html

-

Rewind 2008 VIII: Discos

Álbuns do ano:



PortisheadThird
Arrependi-me tremendamente de não ter ido ao concerto de Portishead de 27 Março, no Coliseu. Numa altura em que se preparam para lançar novo trabalho em breve (já em 2009), o nome Portishead está a tornar-se rapidamente numa ideia de banda mítica, feita do mesmo material que Radiohead e poucos mais, da qual só se espera evolução e revolução. Third é o disco mais original do ano. É inovador no uso da voz e da electrónica, e um corte em relação aos ambientes solitários, urbano-depressivos de discos anteriores, mais associados com o trip-hop dos anos 90.
Queremos mais.
www.portishead.co.uk/



Toumani Diabaté • The Mandé Variations
Toumani Diabaté é um dos descendentes dos mestres de kora do Mali. Nos últimos anos, Diabaté tem atingido sucessivamente maior fama internacional, e com toda a justiça. Música tradicional que não é tradicional - a kora transforma-se num instrumento moderno. Um disco para re-descobrir a música do Mali e de África. O concerto no CCB, em Agosto de 2008, foi uma revelação (ver Rewind 2008 II).
http://www.myspace.com/toumanidiabate

Nick Cave & The Bad Seeds • Dig!!! Lazarus Dig!!!
Confesso que nunca dei muita atenção a Nick Cave. Quando dei por ele, já ele estava em Let Love In e Nocturama, com referências religiosas despropositadas, que pouco sentido faziam para mim na altura. Depois de ver a interpretação de Nick Cave (com Blixa Bargeld) da música From Her To Eternity, na sequência final em As Asas do Desejo de Wim Wenders, resolvi dar-lhe uma segunda oportunidade. À terceira, e depois de Grinderman, e das bandas sonoras de The Proposition e The Assassination of Jesse James... resolvi que Nick Cave merece ser ouvido e que Dig!!! Lazarus Dig!!! é um dos melhores álbuns de 2008.
http://www.nickcaveandthebadseeds.com/

AGF • Words Are Missing
O álbum Explode (2005), resultante da colaboração de AGF com Vladislav Delay, é, na minha modesta opinião, dos álbuns mais originais desta década e uma obra-prima do minimalismo. O álbum a solo que AGF (Antye Greie) fez a seguir, Words Are Missing, é manipulação de sons (electrónicos) no seu melhor, algo parecido com o mundo sonoro exactamente antes da formação/dicção das palavras. O novo álbum do duo AGF/Delay (marido e mulher) tem data marcada já para Fevereiro de 2009.


Label do ano:

RASTER-NOTON:
Alva Noto • Unitxt
Kangding Ray • Automne Fold
Byetone • Death of a Typographer
Ryogi Ikeda

Alguém me sabe explicar porque é que a melhor música electrónica é sempre feita na Alemanha? A label alemã de música electrónica Raster-Noton, fundada, entre outros, por Carsten Nicolai (Alva Noto) em finais dos anos 90, é das maiores forças impulsionadoras da música electrónica contemporânea, principalmente na área do minimal. Todos os discos têm um design impecável e extremamente económico em termos gráficos; o som é algo entre o experimentalismo, ambientes e as batidas do minimal alemão. Os concertos fundem o DJset com o evento multimédia.
Alva Noto é a força motriz da label, o seu album mais conhecido é provavelmente Insen, a segunda colaboração com Ryuichi Sakamoto (o concerto em DVD do tour Insen foi rodado na Casa da Música, Porto). Cada vez mais artistas se tornam visíveis através da Raster-Noton, como Kangding Ray, Byetone, COH e Frank Bretschneider (basta ver o top da revista Wire), numa label que é uma espécie de sucessora da WARP. A WARP parece ter parado no tempo em termos de música electrónica, para explorar outros caminhos, como o rock indie, e por isso, nomes como Aphex Twin, Squarepusher e Autechre tornaram-se grandes demais e são agora a nova regra que é preciso desregular.




Bandas com história, com álbuns que não fizeram história:
The Mars VoltaThe Bedlam in Goliath
Nine Inch NailsGhosts I-IV + The Slip
Einstürzende NeubautenThe Jewels
Beck • Modern Guilt
Elbow
The Seldom Seen Kid

e ainda:
Earth Hex
Black MountainIn The Future
The Last Shadow PuppetsThe Age Of The Understatement
e as Bandas Sonoras de The Dark Knight, de Hans Zimmer e James Newton Howard, e Waltz With Bashir de Max Richter.

Mais tarde neste blog: Manifesto anti-IndieLixo.

Re-edição do ano:

Miles Davis • Kind of Blue (50th Anniversary)

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Rewind 2008 VII: Cinema

TOP 2008

Do pouco cinema que vi o ano passado, estes foram os melhores:

Synecdoche, New York, de Charlie Kaufman
Un Conte de No
e
l, de Arnaud Desplechin
Hunger, de Steve McQueen
The Dark Knight
, de Christopher Nolan
Waltz With Bashir, de Ari Folman
Nightwatching, de Peter Greenaway
Andando, de Hirokazu Koreeda
Happy Go Lucky, de Mike Leigh
Let The Right One In, de Thomas Alfredson
Il Divo, de Paolo Sorrentino
Che, de Steven Soderbergh

Irei adicionar mais títulos à medida que for vendo outros filmes de 2008 que estejam acima da média.
Não fui muito ao cinema em 2008, mas parece que escolhi o ano certo para não ver filmes, porque 2008 foi um ano para esquecer. David Fincher, completamente em contra-natura, deu-nos um dramalhão histórico, com The Curious Case of Benjamin Button; Wall-E foi uma oportunidade perdida para se fazer ficção científica verdadeiramente original; Wong Kar-Wai ficou lost in translation na América, com My Blueberry Nights; Spielberg violou Indiana Jones (sim, isso mesmo); e os melhores filmes que vi em 2008 não são de 2008.

Como em Portugal os filmes chegam às salas 3 meses atrasados (e às vezes muito mais) em relação à data oficial, acontece por vezes estarmos a discutir filmes que, de facto, têm mais que um ano. Por isso, aqui vai um top dos filmes de 2007, já que muitos deles estrearam em 2008 no nosso país:

01. There Will Be Blood (Paul Thomas Anderson)
02. No Country for Old Men (Joel Coen e Ethan Coen)
03. Zodiac (David Fincher)
04. Paranoid Park (Gus Van Sant)
05. Control (Anton Corbjin)
06. The Assassination of Jesse James by the Coward Robert Ford (Andrew Dominik)
07. En La Ciudad de Sylvia (José Luis Guerín)
08. Atonement (Joe Wright)
09. 4 Luni, 3 Saptamani si 2 Zile
4 Meses, 3 Semanas, 2 Dias (Cristian Mungiu)
10. Le Scaphandre et le Papillon
O Escafandro e a Borboleta (Julian Schnabel)
11. Se, Jie ▪ Sedução, Conspiração (Ang Lee)
12. Youth Without Youth (Francis Ford Coppola)
13. The Silence Before Bach (Pere Portabella)
14. Le Voyage du Ballon Rouge
O Vôo do Balão Vermelho (Hou Hsiao-Hsien)
15. The Hoax (Lasse Hallström)
16. Dear Wendy (Thomas Vinterberg)
17. Chansons d’Amour (Christophe Honoré)
18. Sunshine (Danny Boyle)
19. Persepolis (Marjane Satrapi & Vincent Paronnaud)
20. Taxidermia (György Pálfi)



BFI + Michael Snow
Como qualquer cinéfilo que se preze, quando estive em Londres passei pelo BFI (British Film Institute), o equivalente à nossa cinemateca, mas sem o pretensiosismo do Bénard da Costa. Consegui assistir a várias obras de Michael Snow, incluindo uma exposição de vídeo-arte dedicada ao realizador Canadiano e uma masterclass organizada pelo BFI, tudo integrado num ciclo que se prolongou até Janeiro.

Há mais de Snow para além de Wavelength. Para além de toda a informação sobre o desenvolvimento da obra de Michael Snow e o que faz dela única – houve projecção e comentário das primeiras obras – fiquei a saber que Snow adora contar histórias. Principalmente aquelas que têm a ver com as circunstâncias em que as suas obras aconteceram. Ficámos a saber, por exemplo, que não havia grande troca de ideias entre os autores do cinema artístico nova-iorquino (como Andy Warhol) e os autores de cinema experimental ou avant-garde, da geração de Michael Snow, Maya Deren e Brakhage, por exemplo, apesar de todos trabalharem no mesmo medium e na mesma cidade. Acho, no entanto, que muitas das preocupações artísticas de ambos os grupos coincidem. Ao que parece, e pela boca de Michael Snow, os dois grupos foram evoluindo mais ou menos independentemente, com poucos pontos de contacto. Um deles foi na mostra da primeira curta metragem de Snow, quando de entre uma chuva de assobios, Andy Warhol pediu para falar com o autor, porque o filme era “fantástico”!

Para além do realizador, falou-se de Michael Snow o artista multidisciplinar – a pintura, escultura, fotografia – ele que até começou como músico de Jazz. Mas quando interrogado sobre a unificação da sua obra dos diferentes media, Snow oscila entre o silêncio, a ironia e a evasão à pergunta...

http://www.bfi.org.uk/
http://www.bfi.org.uk/whatson/michael_snow_in_conversation_0
http://en.wikipedia.org/wiki/Michael_Snow




INDIE LISBOA ‘08 – 5º Festival Internacional de Cinema Independente – Cinemas Londres, S. Jorge, Fórum Lisboa, Teatro Maria Matos – de 24 de Abril a 4 de Maio de 2008.
Toda a gente já sabe tudo sobre o Indie Lisboa. Como sempre, só vi metade dos filmes que queria ver porque Lisboa inteira decidiu atolhar as salas e ver as últimas aberrações do cinema, filmes que nem de graça veriam em casa. Não é por gosto, é fascínio mórbido. Ou então é por hedonismo e vontade de estar in, ainda não tenho a certeza.
O cartaz de 2008 não foi tão bom como o de 2007, mas a organização parece estar cada vez melhor. Uma característica que à partida seria um ponto negativo – o festival decorrer em pontos separados da cidade – tornou-se um conceito interessante e uma oportunidade para os estrangeiros verem cinema e conhecerem Lisboa ao mesmo tempo. E um motivo para o resto das pessoas andar uns kilómetros a pé e chegar às sessões à conta…

Os melhores filmes que vi no Indie Lisboa 2008:

En La Ciudad de Sylvia (2007), de José Luis Guerín
(3 de Maio, 21:45)
The Silence Before Bach (2007), de Pere Portabella
(27 de Abril, 21:15)
Import Export (2007), de Ulrich Seidl
(28 de Abril, 19:00)
Four by (2008), de Lukas Maximilian, curta-metragem
(27 de Abril, 19:45)

Um dos bons momentos foi a masterclass de Johnny To (Herói Independente 2008) no Maxime.